domingo, 17 de março de 2013

Moxabustão (parte 2)

A moxabustão é uma técnica muito antiga praticada dentro da Medicina Tradicional Chinesa. O texto médico mais antigo que menciona sua prática é o “Livro do Imperador Amarelo” (“Huan Di Nei Jing”), datando do período entre 722 a.C. e 221 a.C.. Por exemplo, no capítulo 73 do seu volume “Eixo Espiritual” (“Ling Shu”), aparecem estas duas importantes recomendações sobre a moxabustão:

“Às doenças onde o agulhamento não for adequado, aplicar moxabustão”.

“Para aqueles em que tanto o Yin como o Yang estiverem deficientes, aplicar a moxabustão”.




Assim, 
segundo os textos clássicos, as principais funções da moxabustão são: 
- Dispersar o Frio e aquecer;
- Dispersar Fatores Patogênicos Externos;
- Tonificar o Qi e nutrir o Sangue (Xue); 
- Promover a circulação de Qi e Sangue (Xue);
- Remover a estagnação de Sangue (Xue);
- Recuperar o Yang debilitado ou colapsado;
- Promover a saúde e prevenir doenças.

Como se pode observar, nem todas essas funções fazem referência ao Calor ou ao Yang, mostrando que a moxabustão 
pode ser usada tanto para padrões de deficiência como para padrões de excesso. Isto amplia a variedade de quadros clínicos em que a moxabustão pode ser usada, desde que sejam obedecidos rigorosamente os conceitos da Medicina Tradicional Chinesa, e enfatiza a ideia de que a moxabustão não é interessante somente pela sua produção de calor. Não podemos nos esquecer de que o clima da China varia de acordo com a geografia, com estações secas e monções úmidas que levam a diferenças de temperatura no inverno (frio e seco) e no verão (quente e úmido). Mesmo assim, a prática terapêutica da moxabustão cresceu, floresceu e prosperou na China. Se essa versatilidade de aplicações da moxabustão não fosse verdade, seu uso seria contraindicado em cidades quentes e úmidas como o Rio de Janeiro ou em países com o clima tão diversificado como o Brasil. 

No entanto, algumas contraindicações reais da moxabustão são:
- Pacientes sob efeito de álcool ou drogas;
- Pacientes hipertensos, em pontos na cervical e na cabeça;
- Febre;
- Intoxicação;
- Áreas hipossensíveis (seqüelas neurológicas, pé diabético, cicatrizes etc);
- Diretamente sobre edemas;
- Alguns pontos, durante gestação.

A moxabustão tem uma série de aplicações clínicas que incluem:
- Gripe e resfriado;
- Cansaço e indisposição física;
- Alterações emocionais;
- Alterações do sistema digestório;
- Deficiência na absorção de nutrientes;
- Anemia;

- Tendinite;
- Artrose.


Aqui cabe uma pequena, mas interessante, história.
Na década de 70, o físico e pesquisador Gou Wen Bin foi convidado para conhecer uma centenária fábrica de cerâmicas na zona rural da região central da China. Seguindo o raciocínio da Medicina Tradicional Chinesa, Gou ficou preocupado com os trabalhadores, pois eles permaneciam na lama durante a maior parte do expediente e uma exposição prolongada das articulações à umidade poderia causar artrite. Entretanto, após a avaliação dos trabalhadores ele constatou que suas impressões iniciais estavam completamente erradas. Ele percebeu que dentre os trabalhadores não havia nenhum caso de artrite! Intrigado, Gou realizou diversos estudos utilizando um espectrômetro na fábrica. Na região do forno, os medidores encontraram um pico com comprimento de onda variando entre 2 e 25 mícron, que é uma estreita faixa do espectro infravermelho. Os fornos produziam temperaturas em torno de 400°C e emitiam este espectro infravermelho pouco comum. Posteriormente, uma análise da argila a qual os trabalhadores ficavam expostos e que era cozida revelou traços de 33 elementos diferentes como ferro, selênio, manganês, zinco, cobalto, cobre, níquel e cádmio. Com base nestes dados, pesquisas posteriores e vários projetos, Gou desenvolveu uma lâmpada com uma resistência de cerâmica que continha aqueles elementos na mesma proporção encontrada na argila da fábrica. Com esta lâmpada, Gou conseguia produzir calor através de radiação infravermelha na mesma faixa encontrada nos fornos da fábrica, obtendo grandes efeitos terapêuticos. O conceito de uso destas lâmpadas foi popularizado pela sigla “TDP”, proveniente do termo chinês para “instrumento especial espectro eletromagnético” (特定电磁波谱: Tèdìng Diàncíbō Pǔ). O instrumento também é chamado de "moxa elétrica", mas ficou conhecido popularmente como “lâmpada milagrosa”. Este instrumento é pouco conhecido no Brasil e atualmente na China utiliza-se muito o TDP associado com fitoterapia. 
Pesquisadores chineses identificaram alguns dos seguintes efeitos terapêuticos gerados pela aplicação do TDP:
- Dilatação dos capilares sanguíneos;
- Maior oxigenação dos tecidos;
- Melhor desempenho do sistema linfático e da circulação sangüínea;
- Auxílio na liberação de toxinas das células;
- Aumento da renovação celular.

Com base nestas pesquisas, muitos estudiosos acreditam que a queima da artemísia produz um espectro de radiação infravermelha específico, estimulando os pontos de acupuntura e processos biológicos do corpo. Talvez seja esse o motivo para o uso da artemísia, e não de outra erva ou de outra fonte de calor superficial, pois cada erva teria uma “assinatura energética” característica. Isso também explicaria porque muitos casos dentro da Acupuntura não são resolvidos somente com agulhas, confirmando mais uma vez a citação dos textos clássicos: “Às doenças onde o agulhamento não for adequado, aplicar moxabustão”.

Fernando M. Pinheiro


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